Observo o bambuzal. Passo os dedos em seus nós, sinto eles como uma quebra, uma cicatriz. De quebra em quebra, de pedaço em pedaço, viram a história de uma vida. Recordo da frase que repetia com orgulho: Sou igual a um bambu, envergo, mas não quebro. Ledo engano, quebrei, e foram tantas vezes que até perdi a conta.

Outro arranjo deste mesmo soneto é a frase da Cora Coralina: “Viver é um rasgar-se e remendar-se”. Entretanto, me enxergo mais como uma mandala, do que como a tela de Penélope. Bambu, Daniela? Isso é piada pronta, ser comprida e magrela me rendeu vários apelidos na adolescência, mas bambu não foi um deles.

Prefiro me ver feita de muitos pedacinhos assimétricos, com diversas cores e luzes transpassantes. Reconheço cada um, eu criei muitos deles, ou permiti que outros me partissem. Por muito tempo acreditei que eu só seria amada se me moldasse ao desejo do outro, e assim o fiz.

Agora sinto que quebrei vezes demais, ora para ser uma pessoa dita normal (boazinha, comportadinha, caladinha), ora para me tornar o que os outros queriam que eu fosse. Encolhi para me encaixar em outras vidas, e forcei espaços para que entrassem na minha.

O bendito Tempo colou os pedacinhos, uns tantos com resignação, outros com tristeza, muitos com raiva, parte deles com medo e alguns com amor. Entretanto, nos últimos anos aprendi uma lição valiosa: é necessário trocar alguns dos rejuntes antigos. Tarefa fácil de entender, porém, não de executar. Substituir os que foram feitos com tristeza, medo e raiva por uma cola mais nobre, o Amor. O Amor sentido, o Amor recebido, o Amor doado. Todavia, antes de usar o Amor ensinado pelos sábios, precisamos daquele que parece o mais difícil de achar nesses casos: o Amor-próprio. Ele é imbatível, nos torna mais resistentes para as mazelas da vida, e ainda tem um verniz de auto-cuidado.

Amarás o teu próximo como a ti mesmo”. Marcos 12:30–31

Afinal, acho que eu sou bambuzinho teimoso rs, não posso esquecer que se me envergar demais posso quebrar, em contrapartida, diante de uma ventania tenho raízes fortes, me tornei uma pessoa resistente e determinada. Busco crescer sempre, com fé e esperança no futuro. Sou também flexível, ou melhor, resiliente, de fácil adaptação e múltiplas inclinações. E tudo isso foi o que me manteve de pé durante as minhas reconstruções.

Observo o bambuzal. Passo os dedos em seus nós, e reformulo a frase: Sou igual a um bambu, envergo, quebro, mas estou de pé.

One Comment

  1. E viva o amor! Especialmente o próprio!❤️

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